quinta-feira, 20 de setembro de 2012

“Acredito que o jornal impresso ainda tem um longo caminho pela frente”

36 anos de jornalismo, 33 desses trabalhando na produção de jornais impressos diários. Essa é a vida de Antônio Crispim, de 53 anos, hoje editor-chefe do jornal O Liberal Regional, de Araçatuba-SP, mas que já trabalhou nos quatro cantos do país. Como repórter, trabalhou em rádios e jornais de Porto Alegre-RS à Santarém-PA. Foi correspondente da Folha de S. Paulo e considera o jornalismo impresso como a sua maior paixão. Crispim fala sobre a evolução do jornalismo, a produção de notícias e expõe sua visão sobre o futuro do jornal impresso. Confira a entrevista.

K.E (Kaio Esteves): Como é a rotina, num parâmetro geral, desde a gráfica até a redação, da produção de um periódico todos os dias?

A.C: Começa com um planejamento matutino, discutindo o que é previsível e o que não é, a partir daí se elabora uma pré-pauta e se escala para o resto do dia. No decorrer do trabalho, observa-se o que se consolidou e a elaboração das matérias: produção de fotos, produção de infográficos, e o acompanhamento da parte comercial também por questão de espaço, para não cruzar o espaço publicitário com determinado material jornalístico, então tudo isso tem de ser observado. A partir daí, de acordo com cada edição, você planeja também a gráfica porque, se você tem uma edição com um número maior de páginas coloridas, ou uma edição especial, uma edição que desperte o interesse acima do normal, você tem que preparar também a gráfica. É todo um trabalho bem coordenado entre redação, comercial e gráfica.

K.E: Falando um pouco dos avanços tecnológicos e que permitiram a facilidade na produção de um jornal, quais foram os benefícios que você viu comparando com os tempos sem esses avanços? 

A.C: Rapidez na informação. Antes, quando não se tinha celular, por exemplo, e você precisava localizar uma pessoa, como localizá-la? Então muitas vezes você perdia duas, três horas de trabalho ou com uma matéria presa, dependendo de uma informação porque não localizada a pessoa. Então os recursos usados eram os recados. Você tinha quatro ou cinco telefones de onde a pessoa poderia estar. Então você ligava e pedia para que, se a pessoa aparecesse, que retornasse a ligação. Você ainda dependia de recado de alguém e ainda dependia da boa vontade da pessoa retornar a ligação. Muitas vezes você tinha que derrubar uma boa matéria por um detalhe. Hoje, não. Hoje a comunicação, a tecnologia, o e-mail, Facebook, e outros meios, você consegue obter informação muito mais rápido. Ganha-se muito em agilidade e informação.

K.E: Como funcionava antes a produção de um jornal sem a internet, sem computador, na máquina de escrever? 

A.C: As agências, que hoje recebemos matérias pelo computador, enviavam os materiais pelo Teletipo e o Telex. A diferença entre os dois é que o Teletipo era um recebimento de informação sem oportunidade de resposta e o Telex você podia obter conversação. No Telex, como hoje você tem um IP de computador, no Telex você tinha um número e passava para alguém o número do seu Telex e a pessoa passava pessoa para aquele número. E era possível, como hoje nos programa de conversação online, era possível estabelecer uma conversação pelo Telex.

K.E: Você prefere o modo como era feita a notícia hoje, ou antes? Por que?

A.C: Hoje você ganha rapidez na informação e consegue trabalhar com mais notícias no mesmo período de tempo. Na época, tínhamos uma notícia com mais informações, mais elaboradas, mais bem trabalhadas... Hoje você tem mais notícias, com menos informações. Isso reflete o próprio momento do cotidiano. As pessoas precisam de mais notícias, mesmo com menos informações. As pessoas precisam estar mais atualizadas. Eu ainda sou um pouco mais das antigas, prefiro a notícia mais elaborada, mesmo sendo menos notícias, mas que esclareça mais o leitor. De qualquer forma, trabalha com jornal impresso, seja antigamente como hoje, é uma das minhas maiores paixões.

K.E: Você acha que o jornalista acomodou-se com as facilidades que são encontradas hoje para produzir um texto?

A.C: Tudo depende da boa vontade do profissional. Em toda a humanidade, todas as invenções foram para reduzir o esforço do homem. A roda foi para diminuir o esforço, a alavanca, o motor, então tudo foi para beneficiar o homem. Agora, o profissional não pode se acomodar. Com a facilidade de informação hoje, ele consegue em três tecladas numa rede social checar quatro, cinco fontes simultâneas. Então isso obviamente é uma ferramente importante, mas, por outro lado, muitas vezes afasta o próprio jornalista do contato direto com a fonte e isso é importante. Hoje é um contato muito virtual. As pessoas se conhecem pelas redes sociais, se conhecem pelo celular, mas muitas vezes não conhece a fonte olho a olho, até onde ela pode confiar no profissional. Acho que essa relação fonte-jornalista e jornalista-fonte são fundamentais. Então, ao ponto que as novas tecnologias facilitam a vida do jornalista, ela acaba tornando superficial o inter-relacionamento com as fontes.

K.E: Qual é a tua expectativa para o jornalismo impresso no futuro? Você acha que pode acontecer de um dia o jornal impresso acabar ou acha que isso não vai acontecer?

A.C: O aperfeiçoamento das mídias digitais é um fato. O jornal impresso vai ter que caminhar, e já está caminhando, para mídia digital, acesso com tablets, smartphones e outros meios. Mas eu ainda vejo um longo caminho para o jornal impresso. Se você observar que as pessoas têm uma facilidade muito grande de acesso a livros, bibliotecas virtuais e continuam comprando livros de papel, as outras gerações possam superar o aspecto físico, mas hoje e ainda algumas gerações imediatas precisam do físico. É o livro físico, o jornal físico, então creio que ainda vai muito longe. É uma tendência a própria agilidade da informação, mas eu acho que o jornal impresso pode superar os digitais pela profundidade da análise. Creio que um dos grandes segredos vai ser a profundidade da abordagem e principalmente a segmentação. Vão se destacar e sobre-sair os médios jornais regionais e cosmopolitas. Os jornais que circulam em Araçatuba, Bauru, São José do Rio Preto, Presidente Prudente e os jornais que circulam nas grandes cidades. O Brasil não tem um grande jornal nacional, tem grandes jornais regionalizados.